20.1.03
LAMÊ
"Lamê" é o nome de uma antologia de poemas de Néstor Perlongher (Editora da Unicamp, 1994). Conheci ontem uma das coordenadoras desse livro, a professora de literatura Berta Waldman. Perguntei mais sobre Perlongher. Uma figura curiosa, "poeta neobarroco", como era chamado, essas coisas. Perlongher nasceu na Argentina, em 1949, e morreu de AIDS em São Paulo, em 1992. Era escritor, poeta, militante homossexual, jornalista, antropólogo (foi professor de Antropologia na UNICAMP), místico envolvido nos rituais do Santo Daime et cetera. Destaca-se, enfim, como uma das vozes mais originais (e polêmicas) da poesia latino-americana de fins do século XX. Gosto da poesia dele (grande parte publicada aqui no Brasil). Uma poesia assumidamente pomposa, carregada de imagens grandiloqüentes, sei lá. "Lamê", por exemplo. Adoraria escrever um livro com esse nome, "Lamê". Aí segue um trecho de um dos poemas do livro, traduzido por Josely Viana Baptista.
Cadáveres
Sob as matas
Pelos pastos
Sob as pontes
Nos canais
Há Cadáveres
[ ... ]
Na mucosidade que se mamona, até, no gargarejo; na também
glacial amígdala; no florete que não se suga com prazer
porque leva uma orla de merda; na cuspida
que se estampa como creme na vara,
na saliva por onde penetra um elefante, nessas piadas
da formiga,
Há Cadáveres
Na conchinha dos pentelhos
No pirulito de um gladiador do sul, sonho
No florim de um perdulário que se emparrala, numas
brechas, no sudário do cliente
que paga um preço desmesuradamente alto pelo pó,
no pó,
Há Cadáveres.
|