1.4.03
DE PROFUNDIS
Janeiro de 1995, quinta-feira. Em roupão e de cigarro apagado nos dedos, sentei-me à mesa do pequeno-almoço onde já estava a minha mulher com a Sylvie e o António que tinham chegado na véspera a Portugal. Acho que dei os bons-dias e que, embora calmo, trazia uma palidez de cera. Foi numa manhã cinzenta que nunca mais esquecerei, as pessoas a falarem não sei de quê e eu a correr a sala com o olhar, o chão, as paredes, o enorme plátano por trás da varanda. Parei na chávena de chá e fiquei. Sinto-me mal, nunca me senti assim, murmurei numa fria tranqüilidade.
Silêncio brusco. Eu e a chávena debaixo dos meus olhos. De repente viro-me para a minha mulher: "Como é que tu te chamas?".
Pausa. "Eu? Edite." Nova pausa. "E tu?"
"Parece que é Cardoso Pires", respondi então.
Extraído do livro "De Profundis - Valsa Lenta", de José Cardoso Pires (Bertrand Brasil, 1998). Leia mais detalhes no texto "Morte Branca", adiante
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