10.5.04
O COMECINHO DA MORTE
Só com o sangue derramado foi que percebi o quanto o chão estava sujo. Restos de insetos boiando nos coágulos, coágulos penetrando entre os tacos, tacos encardidos de poeira. Deixaria seqüelas para sempre, no meu apartamento, coitado, tão humilde e desprezado. Por anos e anos, ratos mendigos e mosquitos preguiçosos viriam se alimentar dos meus restos. Entre as frestas, se eu esfregasse com vontade, abriria um buraco negro no meio do nada, meu apartamento. Coitado, tão humilde e desprezado. Talvez pudesse pentear meus cabelos então, no chão, penetrando entre os tacos. Ou talvez fossem apenas antenas das baratas... Talvez, sim, fosse hora de começar uma faxina. No meu apartamento, coitado, só sobrara eu. Sozinha, mas inteira, ainda.
[ Comecinho do romance "A Morte sem Nome",
de Santiago Nazarian, a ser lançado daqui a pouco,
a partir das 18h30, na Cultura da Paulista ]
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