28.6.04
OS DONOS DA VOZ
Estava ansioso, juro. Joca Reiners disse que eu estava era nervoso, ali, sábado passado, à boca da estréia da peça A Voz do Povo É a Voz de Zé. Peça sugada de meus contos do Angu de Sangue, dos contos do BaléRalé (em cartaz no Avenida Club, só aos sábados, às 20h30). O fato é que a gente sempre quer saber como o ator, a atriz, o diretor vai comunicar a nossa prosa, pensada em casa, escrita sozinha. Qual a graça da minha desgraça? Personagens à míngua? Oh! Ufa! Funcionou. A direção de Alberto Guzik e de Wilma de Souza jogou um casal em cena, mambembe, arrastando uma carroça estilizada, enfeitada de trecos, cenografia e adereços assinados por Tchê Araujo - um talento de manobra esse jovem artista, enfim, ao lado dos figurinos de Adrienne Myrtes. Só vendo. Os dois atores chegam parecendo Carlitos & Esposa. Vindos de um circo de horrores, seria isso? Alojam-se ali, na casa de espetáculos. O público achando esquisito aquelas mesas e garçons do Avenida Club - como se o MST invadisse o antigo Palace, sei lá. Os contos, enfim, começaram a contagiar. Várias vezes os dois atores, Olivia Araujo e Fabrício Garelli, foram aplaudidos em cena aberta. Gargalhadas soltas. Antológicas são as interpretações de The End, em que uma evangélica american-nordestina bufa comparações entre as mortes nos E.U.A. e as severinas. Grande momento, idem, do conto Banho de Espuma, em que o filho e o pai se lambuzam juntos, embaixo do chuveiro e na frente de todo mundo. Eta porra! E o que dizer do conto Darluz, aquele acerca da mulher que dá os filhos como quem perde os dentes? O riso amarelo da platéia presente. Depois vieram o Balé e o conto Muribeca. Inesquecivelmente. Aqui e ali, talvez, tenha havido uma nuance histérica, uma velocidade que precise ser mais controlada, sei lá. Ou será que os meus textos é que pedem essa urgência? Enfim, assado. Em resumo: esse encontro vale a pena ser acompanhado. Esse, raro, de dois atores e dois diretores. Saravá! O encontro com aqueles personagens. Juízos me martelando. Mesmo eu, que acreditava conhecê-los tão bem. Risadas de fantasmas, que não me deixaram dormir. Zés e vozes do além.
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