30.5.05
A PARADA & OUTRAS PARADAS
[1] Se sou gay? Eu nunca disse isso. Se estiver num círculo de amigos, você vai dizer "sou heterossexual"? Por que nossa individualidade tem de ser coletiva?
[2] É bom que entre nos lares brasileiros um pouco de viadagem. Reunir 2 milhões de pessoas não é brincadeira. Eu só me pergunto o que acontece depois: a Parada fica parada? O que acontece nos 364 dias que se seguem? Dois milhões de pessoas virarão 2 milhões de assinaturas para resolver, por exemplo, o problema da bicha suburbana que ficou sem a herança do seu parceiro?
[3] Hoje estamos no tempo do patrulhamento: é preciso provar que Mário de Andrade é um dos nossos. Milton Nascimento? Estamos atrás, estamos de olho. Mas o que é isso? Existe pergunta mais primitiva do que "você é gay ou não é?". Por que o Paulo Autran deveria respondê-la?
[4] Tudo que se institucionaliza, que vira bandeira, me faz ficar cabreiro. Assim se perde a poesia, o troca-troca.
[5] Antigamente, a maior passeata gay que havia, sabe qual era? O defile militar. Pela independência. Com os canhões e os cavalos. E os heróis aposentados.
[6] O enterro do papa também foi um evento homossexual. Aquele povo com aquelas roupas vermelhas, os cardeais. Não tinha cara de desfile gay, mas efetivamente tinha muitos gays por lá - e não precisou de bandeira para que isso fosse legítimo.
[7] O que é isso agora? O lugar do gay, o lugar do negro, o lugar do branco? Eu quero ser tudo. E quero estar em todo canto.
[Trechos de entrevista minha concedida ao jornalista Fred Melo Paiva, no caderno Aliás, do jornal O Estado de S. Paulo, ontem, domingo}
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