11.3.08
SOLIDARIEDADE ENTRE ESCRITORES
Porventura não está farto de palavras como solidariedade, união entre escritores novos, comunhão de interesses e outras que tais? Entendo solidariedade e coisas do tipo na bolsa, em política, em negócios de religião (seita) etc., mas entre os escritores jovens a solidariedade é impossível e desnecessária... Não podemos pensar e sentir todos do mesmo modo, temos objetivos diferentes ou nem sequer os temos, conhecemo-nos pouco ou nem sequer nos conhecemos e, portanto, não existe nada a que a solidariedade possa agarrar-se solidamente... E precisa-se dela? Não... Para ajudar um colega, para respeitar sua personalidade e seu trabalho, para não falar mal dele nem invejá-lo, para não ser mentiroso e nem hipócrita com ele, para tudo isso não é preciso ser um escritor jovem, mas um homem feito... Se formos pessoas comuns, se tratarmos a todos do mesmo modo, então não haverá necessidade de uma solidariedade artificialmente suscitada. A tendência persistente a uma solidariedade particular, profissional, de grupo, como a que vocês pretendem, acarretaria uma involuntária espionagem recíproca, desconfianças, controles, e, mesmo sem desejarmos, nós nos tornaríamos uma espécie de sócio jesuíta um do outro... Eu, caro Jean, não sou solidário a você, mas prometo-lhe até o fim da vida plena liberdade como escritor; ou seja, pode escrever onde e como quiser [...], mudar mil vezes de opinião e de endereço etc. etc., sem que por isso as relações humanas entre nós mude uma vírgula, e eu sempre anunciarei os seus livros nas capas dos meus. Posso prometer o mesmo aos demais colegas, e desejaria o mesmo também para mim. A meu ver, essas são relações mais do que normais. Somente se elas existirem, será possível a estima, e até mesmo a amizade, e a simpatia nos momentos difíceis da vida.
[ De Anton Tchékhov para Ivan Leóntiev (Chtcheglov), Moscou, 3 de maio de 1888 - Trecho extraído do livro "Sem Trama e Sem Final" - Martins Fontes. E mais não digO. E nem sei mesmo por que eu estou dizendo isso e ave! E fui e aquelabraço, amém e saravá e beijos no umbigo. ]
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